13 agosto, 2010

Platice...

Conversava hoje com uma amiga que conheci recentemente, figura muito legal, e que se queixava a respeito de uma aula chata de grego. Compreensível.
Nada contra o helenismo (ou vocês esquecem que eu cursei filosofia?). Aprender novos códigos sempre encerra um quê de trabalho metódico e paciente, seja um sistema de escrita alfabética, seja numérico (quem se esquece da tabuada? E quem se lembra? rs). Idiomas não fogem à regra. São um pé no saco pra aprender. É consenso que não há modo melhor de treinar uma língua a não ser a prática.
Penso, contudo, que não há nada na vida que, num dado momento, se veja livre da metade entediante, da porção chata. Mas a chatice é subestimada, sabe! Ela é em grande parte responsável pela diversão. Senão por causalidade ou semelhança, ao menos por contigüidade. Bem, definitivamente por contraste! rsrs

O legal é que não há um consenso sobre o que é chato.
Eu, por exemplo, me divirto à beça com a teoria.
Teoricamente, chato mesmo é o vice-versa...
Esquece, amiga, tô falando grego... kkk

Kantico doS kanticOS

Leonard: It must be hell inside your head.
Sheldon: [pause] At times. ...

(from 'The Big Bang Theory' show)

Você já parou pra pensar na gratuidade das relações interpessoais?
Muito se apregoa que não devemos usar as pessoas.
Pessoalmente, tento me convencer de que esta é a meta absoluta da minha vida, a ponto de abrir mão de todas as outras pessoas, cercando-me de coisas e idéias.
O que é a amizade senão o conforto da afirmação recíproca das consciências, garantia de estar certo e poder assim deitar a cabeça no travesseiro sem sombras de dúvidas? A facilidade de uma série de vantagens práticas e a garantia de recompensas afetivas?
É evidente que consideramos esses intercâmbios de afeto e aprovação como vitais.
Mas até que ponto são desinteressados, gratuitos?
Por quais motivos nos permitimos cercar por determinadas pessoas, evitando outras? Não é algo sumamente projetivo e conveniente? Buscar o prazer e evitar a dor? E tais pessoas não se convertem em meios para essa satisfação?
Algumas pessoas poderiam argumentar que estas são típicas situações 'win/win': fulano me faz bem, eu faço bem para fulano. O que constitui isso senão uma troca? E onde entra aí a tão propagada - e propagandeada - gratuidade? Não será ela um lenitivo para nossas consciências, essas pedras fundamentais que não fazem senão justificar nossas hipocrisias e ratificar nossos procedimentos utitlitaristas?
E o amor? Seria uma progressão lógica de uma amizade, reafirmação biunívoca, onde também os corpos entrariam no contrato?
Que seja triste propor assim nesses termos, eu aceito (embora não menos digno, nem definitivamente menos lógico que qualquer outro procedimento). Que me acusem de simplista, reducionista, maluco, ingrato, doente ou chato elevado a Googl... aceito. Honestamente eu não me inclinaria a discordar de nenhuma dessas caracterizações. Mas não deflito. Minha compulsão analítica persiste.
O que acontece é que, ou se admite forçosamente que usamos e somos usados, somos (também) objetos e a gratuidade é uma grande balela que serve de mero catalisador para nossas ações puramente egoístas, ou isso, ou que me queiram provar o contrário, de onde resultaria que qualquer esboço ou tentativa de fazê-lo já seria uma reação narcísica por parte de algum pretenso desinteressado - profundamente interessado em ter razão - ao meu discurso egoísta filhodaputa.
Além disso, como condenar alguém que conscientemente e de modo deliberado, seja no atacado, seja no varejo, instrumentaliza pessoas? Íntima ou institucionalmente? Atire a primeira pedra...
O que seria fraqueza, afinal? Resignar-se ao 'somos todos imperfeitos e cometemos erros...' ou prescindir radicalmente de nossas relações?
Presumo que a segunda hipótese seja dificilmente passível de verificação visto que as pessoas sofrem de um sério impulso de se auto afirmarem, ao nível da perpetuação (alegando as intenções mais altruísticas ou simplesmente alegando que a camisinha definitivamente interfere na sensibilidade. Além do mais, o intolerável tédio de uma existência absolutamente solitária nada tem que ver com isso). Resta a constatação de que tal alternativa resulta impraticável.
De qualquer modo recaímos num cálculo pragmático da matemática prazer x dor. Escolhe-se a menos nociva tendo em vista preponderantemente a si mesmo, obviamente.
A natureza daquilo sobre que me questiono por detrás dos critérios através dos quais "deixamos entrar quem quisermos em nossas vidas" e o uso pragmático ou não que delas fazemos, resulta demasiado clara e evidente para todos nós: o que seja a liberdade de escolha ou sua ausência, a questão da responsabilidade pelas nossas próprias razões em oposição ao caráter pretensamente inautêntico da existência e, em última instância, o que seja a confiança.
O fato de querer expô-lo publicamente revela algo não menos importante, quer uma urgência de avaliação e tentativa rigorosa de reflexão, quer uma necessidade de compartilhar tais raciocínios e conteúdos. Talvez um primeiro movimento dialético a espera de contrapartida (e nesse sentido, uma insuficiência e esgotamento da capacidade autoanalítica).
Que a linguagem utilizada aqui para expressar tais raciocínios é um dado relevante e sobremaneira eloqüente em relação a pelo menos um de meus critérios de seleção construídos até então, não há dúvida. Ele revela coisas importantes porque significativas (sintomáticas?)sobre minha própria pessoa. Posto isto, temos algo como certo. Mas devemos nos perguntar: constitui esse um critério válido? E em relação a que? Eis a questão.
Tomando como pressuposto que não devemos nunca tomar nenhuma pessoa como meio para um fim exterior a ela, à sua dignidade de pessoa minha inclinação seria de que o mais acertado seria o abster-se o máximo possível dos contatos e relações pessoais. A convivência, entretanto, é um dado, não há dúvida. Nada do que eu fizer mudará absolutamente a ordem das coisas enquanto sociedade e cultura. Resta a minha convicção pessoal de fazer o que minha consciência individual julga como acertado para a maioria e tomar como exemplar tal comportamento, desejável para todos como regra universal, ou aceitar a hipocrisia como elemento integrante do protocolo social, aceitar usar e ser usado, na medida do possível estabelecendo de antemão as regras do contrato (esperando que um outro tão imperfeito e egoísta quanto eu faça o mesmo) e reconhecer-me como mais um ser humano falível e contraditório, suscetível de minhas obscuras motivações inconscientes, fraco de vontade e de propósito, um tanto ilógico porque também bestial, naturalmente interesseiro e egoísta, etc., etc., etc. Acima de tudo irmanamente hipócrita.