25 janeiro, 2012

In diesem Haus gibt es eine Gottheit (und es ist bei mir tropft)


Esgotamento, sono, reencontro com o silêncio, coincidindo com aquela nostalgia - misto de solidão, (até onde necessária?) e a eterna tentação de fugir ao nada, ao quotidiano existencial. Re-sentimentos. "Louco,
fora das fronteiras da internabilidade", eu dizia,
dando ouvidos a Pessoa. Nada poderia ser
 mais enganoso. Não. Não fora posto
que internado em mim mesmo,
paciente (que remédio?), submetido
à mesma ração de pensamento,
regime de autome(n)dicação.
Meu sanatório sou eu.
Eu, minha perambulância.
Eu, comprimido.
Eu, prontuÁrio.
Pra onde vou quando me der a(u)ta?
Quando me alt(u)ar? (mia alto o ar, me out to art, autuar, toire, toir, toi, oi...       
Abraço a camisa.
In s(ómnia)...
De-mentia.
Se(m)cura.
esgota-mento
esgota-ment
sgota-me
got a
got
go
o
o ) )  )    )       )          )

10 janeiro, 2012

Com fiança:

eu nunca a prendo...

E agora, José? (Carlos Drummond de Andrade)

Se um homem encara a vida de um ponto de vista artístico, seu cérebro passa a ser seu coração. (Oscar Wilde)

"O coração, se pudesse pensar, pararia. (Bernardo Soares/ Fernando Pessoa)

09 janeiro, 2012

allembru

"Há um grande número de amigos de Robert presentes, mesmo no inverno. Penso que é porque Robert era incomum. Creio que é o que trouxe muitos de vocês aqui.
Marido e pai amoroso por anos. Bom amigo de alguns de vocês há ainda mais tempo.
Tenho certeza que é por isso que apreciamos e amamos Robert.
Ele foi excelente.
Altruísta.
Resoluto.


(Dave, em off) Lembro-me uma vez ... ficar imaginando como seria minha vida, o que eu poderia ser. Imaginei ter todas essas qualidades. Fortes, positivas... atributos ali, à mão, que a gente pudesse simplesmente pegar do outro lado do quarto. Mas com o passar do tempo ... poucas tornaram-se quaisquer qualidades que eu realmente tivesse. E todas as possibilidades que eu enfrentei, e as muitas pessoas que eu poderia ser, quedaram todas reduzidas a cada ano para menos e menos ... até que finalmente se restringiram a uma... a quem eu sou.
E isso é quem eu sou... o homem do tempo."


(The weatherman/ O Sol de Cada Manhã, 2005, direção de Gore Verbinski)


08 janeiro, 2012

Irã

Responda rápido, Joãzinho: Se os persas vêm da Pérsia, daonde vêm os Medos?
Da Mídia, professora!

03 janeiro, 2012

Diário lúcido (Bernardo Soares)


A minha vida, tragédia caída sob a pateada dos anjos e de que só o primeiro acto se representou.

Amigos, nenhum. Só uns conhecidos que julgam que simpatizam comigo e teriam talvez pena se um comboio me passasse por cima e o enterro fosse em dia de chuva.

O prémio natural do meu afastamento da vida foi a incapacidade, que criei nos outros, de sentirem comigo. Em torno a mim há uma auréola de frieza, um halo de gelo que repele os outros. Ainda não consegui não sofrer com a minha solidão. Tão difícil é obter aquela distinção de espírito que permita ao isolamento ser um repouso sem angústia.

Nunca dei crédito à amizade que me mostraram, como o não teria dado ao amor, se mo houvessem mostrado, o que, aliás, seria impossível. Embora nunca tivesse ilusões a respeito daqueles que se diziam meus amigos, consegui sempre sofrer desilusões com eles — tão complexo e subtil é o meu destino de sofrer.
Nunca duvidei que todos me traíssem; e pasmei sempre quando me traíram. Quando chegava o que eu esperava, era sempre inesperado para mim.
Como nunca descobri em mim qualidades que atraíssem alguém, nunca pude acreditar que alguém se sentisse atraído por mim. A opinião seria de uma modéstia estulta, se factos sobre factos — aqueles inesperados factos que eu esperava — a não viessem confirmar sempre.
Nem posso conceber que me estimem por compaixão, porque, embora fisicamente desajeitado e inaceitável, não tenho aquele grau de amarfanhamento orgânico com que entre na órbita da compaixão alheia, nem mesmo aquela simpatia que a atrai quando ela não seja patentemente merecida; e para o que em mim merece piedade, não a pode haver, porque nunca há piedade para os aleijados do espírito. De modo que caí naquele centro de gravidade do desdém alheio, em que não me inclino para a simpatia de ninguém.
Toda a minha vida tem sido querer adaptar-me a isto sem lhe sentir demasiadamente a crueza e a abjecção.
É preciso certa coragem intelectual para um indivíduo reconhecer destemidamente que não passa de um farrapo humano, abono sobre-vivente, louco ainda fora das fronteiras da internabilidade; mas é preciso ainda mais coragem de espírito para, reconhecido isso, criar uma adaptação perfeita ao seu destino, aceitar sem revolta, sem resignação, sem gesto algum, ou esboço de gesto, a maldição orgânica que a Natureza lhe impôs. Querer que não sofra com isso, é querer de mais, porque não cabe no humano o aceitar o mal, vendo-o bem, e chamar-lhe bem; e, aceitando-o como mal, não é possível não sofrer com ele.

Conceber-me de fora foi a minha desgraça — a desgraça para a minha felicidade. Vi-me como os outros me vêem, e passei a desprezar-me não tanto porque reconhecesse em mim uma tal ordem de qualidades que eu por elas merecesse desprezo, mas porque passei a ver-me como os outros me vêem e a sentir um desprezo qualquer que eles por mim sentem. Sofri a humilhação de me conhecer. Como este calvário não tem nobreza, nem ressurreição dias depois, eu não pude senão sofrer com o ignóbil disto.

Compreendi que era impossível a alguém amar-me, a não ser que lhe faltasse de todo o senso estético — e então eu o desprezaria por isso; e que mesmo simpatizar comigo não podia passar de um capricho da indiferença alheia.

Ver claro em nós e em como os outros nos vêem! Ver esta verdade frente a frente! E no fim o grito de Cristo no calvário, quando viu, frente a frente, a sua verdade: Senhor, senhor, porque me abandonaste?
s.d.
 
Livro do Desassossego por Bernardo Soares. Vol.I. Fernando Pessoa. (Recolha e transcrição dos textos de Maria Aliete Galhoz e Teresa Sobral Cunha. Prefácio e Organização de Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1982.
 - 243.
"Fase confessional", segundo António Quadros (org.) in Livro do Desassossego, por Bernardo Soares, Vol II. Fernando Pessoa. Mem Martins: Europa-América, 1986.